Comecei a ler Ideologia e Contraideologia, de Alfredo Bosi (2010). Ainda muito cedo para formar uma opinião, é verdade, mas tenho quase certeza de que vou gostar do livro. O motivo primeiro é muito simples: sou fã do autor. De qualquer modo, o que me leva a escrever estas linhas é que não deixo de pensar como professor, mesmo quando não o desejo. Acompanhar o primeiro capítulo foi também pensar em como os discursos circulam na escola e para onde conduzem os educandos. Tentarei me explicar melhor.
Ao escavar a pré-história da palavra “ideologia”, Bosi nos conduz à cultura renascentista, a uma Europa que se permite denunciar as correntes hegemônicas que a constituem. Não, naturalmente, sem muitos problemas para aqueles que desejavam questionar o tido como normal. Bosi aponta que, no século XVI, os principais discursos hegemônicos eram
“os dogmas recém-promulgados pelo Concílio de Trento e pela Contrarreforma, ou, do lado oposto, pela teocracia implacável de Calvino fundada na doutrina da predestinação;
a apologia da perseguição aos judeus, que marcaria ainda todo o século XVII;
o direito divino dos reis (...);
a censura à nova ciência e ao livre-pensamento (...);
o triunfo da imitação estilística dos Antigos elevada a norma da retórica maneirista que prenuncia o barroco internacional” (BOSI, 2010: 15,16).
A tentação deste leitor foi, de imediato, a tentativa de identificar os principais discursos hegemônicos da atualidade. Após pensar na hipervalorização do consumo e do sexo, a superficialidade manifestada tanto nas relações pessoais como na relação com tudo o que se constitua alheio, a facilidade para a ruptura com a memória e a tradição e um longo etc que me fez considerar que eu deveria parar um pouco para pensar antes de continuar. Fica para outro dia.
O que me pareceu curioso é que Bosi aponta que nesse primeiro momento de constituição do que hoje chamam ideologia, encontram-se o discurso satírico e o utópico, como meios de desmascarar as realidades presentes e apontar novas possibilidades. Agora, meu pensamento chegou à Escola, como proposta curricular: saber olhar! E os olhos que se detém no normal inquirindo a normalidade que ali se vê. O olhar que vê e que anuncia aquilo que vê, com sensibilidade e cautela (Por mais idealista que seja, não gostaria de ser decapitado como Thomas Morus), mas também com bom humor e esperança.
Os discursos utópico e satírico bem que poderiam ocupar uma boa parte do fazer curricular de uma Escola, não pelo que eles representaram no século XVI e XVII, mas pelo que eles permitem atualmente: indagar e fazer indagar, sonhar e, desse modo, começar um projeto.
Escrevo tudo isto com muita liberdade, como leitor que saboreia as páginas do que lê...
BOSI, Alfredo. Ideologia e Contraideologia. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
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