30 de outubro de 2010

AFINAL, PARA QUE SERVE A ESCOLA?

Escola para quê?


Usualmente me chamam para conversar com pais e professores (raramente ao mesmo tempo, diga-se) sobre a necessidade de um novo olhar para a educação. Mudar a educação, melhorar a educação, pensar em novas realidades... Muitas vezes, chego ao final da conversa um tanto desanimado. Tanto com pais como com professores. Em algum momento, muitas vezes já logo no começo da conversa, surge a pergunta: "E o vestibular?".

A experiência já me mostrou que essa pergunta é mais uma forma de resistência ao novo do que a preocupação com o processo seletivo em si mesmo. Processo esse que tem passado por significativas transformações e, de algum modo, procurado aproximar-se de concepções mais atualizadas de educação. Em especial, no que respeita à linguagem, caminho privilegiado para a construção do conhecimento e da identidade no século XXI.

O que me decepciona ao se trazer o vestibular para a discussão é que ele ainda assume, no imaginário do pais e demais educadores, o destino final da educação formal fundamental e média. Discussão sobre cinema? Educação do corpo? Relações entre mídia e cotidiano? Drogas? Formação do leitor? Tudo isso sim, mas desde que não atrapalhe o vestibular. E não o vestibular atual, cada vez mais interessado nessas questões, mas um vestibular imaginário, fossilizado na dificuldade em aceitar o novo.

Fala-se muito em educação de qualidade, mas eu, por vezes, questiono até que ponto, efetivamente, desejamos essa qualidade. Educarmo-nos para pensar o presente, construir o novo, dialogar com o passado, reformular a sociedade, transformando-a, isso tudo é trabalhoso, lento, aparece menos do que gostaríamos. Educação para o vestibular é algo imediato, aparece fácil, dá resultados. Mesmo que esse vestibular não seja competitivo e apenas venda a ilusão de que se 'passou' nele. Mesmo que depois do vestibular da FUVEST ou da Unicamp o estudante não consiga acompanhar o curso por falta de habilidades. Pouco importa.

Em política ocorre algo parecido: preferem-se asfaltar ruas a fazer saneamento básico. Uma rua asfaltada vende mais o futuro candidato a alguma coisa. O saneamento básico não dá votos. Pouco importa se, com isso, dissemina-se a ideia de morte. Sempre se achará uma terceira via para dize que a culpa é do outro.

No futebol e no mundo do entretenimento também é assim: o 'famoso' é pego drogado, fazendo escândalo, sendo mau exemplo só para pouco depois aparecer com ar de vítima dizendo que ele sempre foi uma pessoa decente e que retomou o seu 'verdadeiro eu'.

O 'verdadeiro eu' não é algo dado, se elabora todos os dias a partir das escolhas que fazemos, cotidianamente.

Educação para construirmos o verdadeiro eu, um ser legitimamente atuante no mundo ou alguém hipócrita que se esconde atrás de fórmulas prontas, tais como o vestibular imaginário.

23 de outubro de 2010

O OLHAR QUE VIU A BIENAL

Ontem, em uma reunião de trabalho, uma educadora falou sobre a importância de 'educar o olhar'. Gosto muito dessa expressão. Fiquei atento a como foi empregada. A educadora mostrava-se experiente em seu fazer e paixonada pelo que faz, tanto que fiquei tentado a perguntar-lhe como ela mantém a paixão 35 anos depois, mas o pudor me impediu de fazê-lo. Empregou a expressão com muita acuidade, como quem sabe que na palavra olhar cabe o conhecimento, a sensibilidade, a cultura, a compreensão de si mesmo, do outro e do estudo.
Falávamos do corredor da escola. Os alunos fazem trabalhos interessantes que depois vão ser 'expostos'. Essa exposição, muitas vezes, se reduz aos trabalhos serem colados nos corredores da escola, em áreas de passagem. Apenas para serem aos poucos (ou rapidamente!) destruídos por colegas negligentes.
Vivo em São Paulo, cidade da Bienal, do Museu da Língua Portuguesa, do MASP, da Pinacoteca... Mas, mesmo antes de aqui viver eu já tinha ido a exposições e a museus, claro.
O último grande evento de que participei foi a visita à Bienal de Artes. O meu olhar, inquieto, pensou nos trabalhos dos professores no corredor. Não que eu tenha visto, na Bienal, a perfeição em se expor a arte. Como outros, considerei-a um tanto confusa e fiquei, por momentos, desorientado. Além disso, não cheguei a ver os urubus e fiquei como outros comentando o espaço vazio. Mas, sem dúvidas, notava-se que havia ali uma preocupação em expor, em fazer com que o caminhar entre as obras fosse também, de algum modo, uma experiência cultural.
Esse é um (mais um...) desafio para o meu olhar de educador: como fazer com que o caminhar entre os trabalhos dos nossos alunos seja mais do que colar tais trabalhos no corredor na esperança de que sobrevivam mais do que período?