17 de dezembro de 2008

AO NOVO ANO



Um comercial das casas Bahia de fim de ano diz que o Natal é bom porque é a preparação do Ano Novo. A informação veiculada como depoimento de uma cliente me incomodou: dentro da tradição cristã que constitui a nossa sociedade, definir de tal modo o Natal é, para mim, um retrocesso, independentemente de crer ou não em Deus.

Hoje, voltando para casa, a pé, ouço um comentário passageiro entre dois rapazes que passeavam os cães pelo bairro - cães que, provavelmente, não eram deles, mas escrever sobre isso será para outra vez! Um deles diz para o outro algo como "Mas, para o ano que vem, já decidi, não vou faltar na escola nunca, só se eu tiver muito doente mesmo!". Meu ouvido vibra em outra freqüência quando ouço a palavra 'escola'. É uma praga que me foi lançada por uma bruxa má do leste ou algo assim. Escutando-a, tentei contextualizar aquela fala. Parece-me que ele havia perdido o ano por faltas e estava renascendo em esperanças na possibilidade do novo ano. Um recomeço, uma ressurreição!

Retomando o conceito de 'tradição cristã', acho que a festa magna não é o Natal, mas a Páscoa. Na Páscoa temos a oportunidade de ressuscitar. De algum modo, também o temos no Ano-Novo. Deveríamos ter essa oportunidade todos os dias, a cada dia, mas estamos ocupados demais em morrer para pensar em ressuscitar. O ano que se inícia acena com essa possibilidade: Não perder aulas, encontrar um novo trabalho significativo, escrever um livro, construir um amor eterno... Desse ponto de vista, o novo ano acena-se como ressurreição. Uma Páscoa no início de janeiro. Uma Páscoa que começa com o Natal.

Nascer, ressuscitar, acolher, recomeçar. Em breve, nós que agora estamos às voltas com os términos, estaremos envolvidos com os recomeços. Entre eles um intervalo sempre insuficiente para tudo o que desejamos e precisamos, mas que seja suficiente para acolher a vida e ressuscitar em nossas esperanças e propósitos de continuar caminhando.
Espero que o rapaz que passeava os cães possa não faltar mais às aulas no novo ano que renasce, que cultive essa esperança e a faça brotar firme em 2009!

16 de dezembro de 2008

15 de dezembro de 2008

DESENVOLVENDO A COMPETÊNCIA LEITORA - parte 1



Há 4 (quatro) grandes áreas estratégicas ao pensarmos em desenvolvimento da habilidade de leitura:

  • Formular previsões sobre o texto que será lido

  • Formular perguntas sobre o texto foi lido

  • Esclarecer dúvidas

  • Resumir as idéias chave

A partir dessa perspectiva, é importante pensar em diversas estratégias que remetam a uma ou outra dessas áreas.

Tomemos, por exemplo, a habilidade de 'resumir idéias chave'. Não é suficiente apenas pedir 'faça um resumo do que leu'. É necessário valorizar o processo que permite compreender como se faz um resumo. Segue um exercício que visa ao desenvolvimento dessa habilidade:

Divida o texto que será lido pelos alunos em trechos de 1 (um) a 4 (quatro) parágrafos. Apresente essa divisão a seus alunos. Organize a classe em grupos de três a quatro elementos.

A proposta é simples: os alunos deverão pôr títulos nos trechos selecionados em folhas a parte. O título deverá ser uma frase simples, com sujeito e predicado (verbo + complementos ou predicativos). O importante é estar atento ao conceito que serve de fio condutor. Em caso de dúvidas, promova uma leitura mais atenta do trecho.

Ao término da atividade, convide os alunos para que sejam eles mesmos a supervisionar o trabalho. Faça isso trocando as folhas entre os grupos, de modo que cada um possa avaliar se os colegas agiram adequadamente. Anotações deverão ser escritas a lápis, visando a melhoria dos títulos selecionados.

O papel do professor será supervisionar a atividade, esclarecendo dúvidas e verificando os rendimentos nos dois momentos: o de elaboração dos títulos e o de avaliação do trabalho dos colegas. Na segunda ou terceira vez que fizer uma atividade semelhante, devolva os trabalhos aos respectivos grupos, para que eles possam agir de acordo com as avaliações feitas, conforme julgarem procedente.

Os alunos que aprendem a supervisionar outros desenvolvem, aos poucos, também a habilidade de supervisionar a si mesmos.

9 de dezembro de 2008

A TOLERÂNCIA E A EDUCAÇÃO


Hoje, a palavra 'tolerância' provoca diversas e, por vezes, antagônicas reações. Alguns consideram que 'tolerar' é um vocábulo sempre insuficiente ao falarmos da relação com o outro. Desse modo, 'tolerância sexual' ou 'étnica' parece inapropriado ao falarmos da nossa relação com a diversidade sexual ou étnica que compõe a nossa sociedade. Essa idéia, contudo, não é nova. Já na França da Revolução que mudou o mundo, alguns pensavam, ao falar de 'religião', que tolerar era uma atitude condescendente, restritiva e, por vezes, tirânica. Alguns filósofos da época preferiam antes termos como 'simpatia' ou 'respeito'.

Aqui cabe, no entanto, diferenciar opinião de conduta. Quando se diz que "fulano é sexualmente muito tolerante" - ou politicamente, ou culturalmente ou ... - está-se muitas vezes confundindo condutas - que, certamente, envolvem opiniões - das opiniões em si. As condutas, parece-me, são regidas mais por 'direitos/deveres' do que por 'tolerâncias'. Efetivamente, o outro, sendo outro, tem, no entanto, os direitos e os deveres que eu tenho. Não se tolera o pobre, nem o negro, nem o homossexual, nem... mas convive-se com, respeitando os seus direitos de partilhar, conosco, o mesmo espaço e construir, conosco, aquilo a que chamamos sociedade.

Mas, toleramos a opinião do outro que é contrária à nossa. Mesmo, ou melhor, principalmente, se a considerarmos falsa ou incoerente. O outro tem direito a pensar o que quiser, desde que respeite o meu direito de sustentar uma opinião oposta. O que vai intermediar esses extremos? A palavra. O objetivo da tolerância é que os seres humanos, no convívio entre si, possar crer e dizer o que lhes pareça ser verdade e que possam expressar isso, de modo a não pagar qualquer ônus de violência ou desrespeito. Isso entendo como PAZ.

Há, de fato, domínios em que a verdade é facilmente alcançável: regras gramáticais, leis morais, teoremas matemáticos etc. Não há muito o que tolerar efetivamente. Se alguém diz "a terceira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo 'estar', de acordo com a norma padrão da língua portuguesa, é 'estera'", essa pessoa mente. Sua afirmação não pertence ao espaço do tolerar. Há, no entanto, domínios constitutivos do ser humano que são caracterizados pela incerteza. Alguns exemplos? Que modelo democrático é melhor? Que ética é melhor? Que religião é a mais correta? Onde está a felicidade? Nesta esfera de questionamentos, a reflexão permite-nos construir uma verdade - mas não A verdade - que deverá sempre dialogar com outras verdades construídas pelos outros, que têm igual direito de refletir e de, como nós, construírem as suas verdades.

Aqui parece-me ser o terreno fértil para a tolerância: a habilidade de dialogar sem violência, de coexistir com a opinião alheia, de iluminar-se por esse outro modo de pensar, sem perder a essência de quem somos - a nossa verdade.

E é a palavra que constrói as pontes da tolerância. A escola, lugar por excelência onde se aprende a usar a palavra deve preocupar-se em ser um lugar onde, mais que ensinar, se pratica a tolerância. Um lugar onde os alunos podem pensar o que quiserem - até o que nos pareça absurdo, como ser a favor do racismo ou da homofobia - desde que, junto, aprendam a defender suas idéias e - ainda mais importante - ouvir com critério e bom senso a idéia do outro, aceitando rever seus próprios conceitos quando a evidência assim o exige.

É por essa escola que escrevo estas linhas.

8 de dezembro de 2008

OS GÊNEROS TEXTUAIS NA ESCOLA


Muito se tem falado de gêneros textuais e escola. Atualmente, são vistos como o melhor caminho para o desenvolvimento do processo interativo de ensino-aprendizagem. Para alguns, que são a panacéia da vez. Como toda onda que chega à escola propondo-se a solucionar problemas, cria outros, por vezes maiores, fruto de má compreensão e falta de aprofundamento do tema. Talvez pior que o desconhecimento seja o mau conhecimento do tema.

Os gêneros textuais são, ao mesmo tempo, eventos lingüísticos e ações sociais. São modelos comunicativos que permitem aos interlocutores gerarem expectativas e previsões para elaborar a compreensão. Definem-se tanto por aspectos formais como funcionais, sendo estes últimos muito mais importantes. Ou seja, é mais importante entender a função do que a forma. E esse é um dos grandes problemas da escola, tradicionalmente espaço para formas e modelos prontos, não para reflexão e interatividade.
O estudo do gênero projeta a língua para a sua dinâmica social e histórica, superando uma concepção que a via apenas como instrumento para representar a realidade. A língua é a própria realidade: por meio dela agimos sobre o mundo e, de algum modo, o constituímos.

Os gêneros textuais são formas de realizar lingüisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares. São artefatos culturais construídos histórico-socialmente pelas pessoas. Por isso mesmo, muitas vezes, o predomínio da função supera a forma na determinação do gênero. Por exemplo, é possível ter uma notícia sem 'lide' e, ainda assim, será socialmente aceita como notícia. O mesmo para uma carta que não tenha vocativo, mas que comece com algo como "Que saudades de você!".

As dificuldades que a escola enfrenta ao centrar seus trabalhos nos gêneros localiza-se muito mais na dimensão social, portanto, funcional, do trabalho da linguagem do que na formal. Isso porque o ensinar o gênero pressupõe um anterior conviver com o gênero que, muitas vezes, não ocorre. Os gêneros refletem estruturas sociais recorrentes e típicas de uma determinada cultura. Isso exige que os trabalhos escolares com o gênero apenas se façam levando em conta a cultura na qual o gênero se constitui como ação social. Como explicar adequadamente o que são 'artigos de opinião' se a leitura dos mesmos não faz parte do meu cotidiano?

E assim inventamos novas listas de características para decorar e mais angústia por parte de quem aprende e de quem ensina.