9 de dezembro de 2008

A TOLERÂNCIA E A EDUCAÇÃO


Hoje, a palavra 'tolerância' provoca diversas e, por vezes, antagônicas reações. Alguns consideram que 'tolerar' é um vocábulo sempre insuficiente ao falarmos da relação com o outro. Desse modo, 'tolerância sexual' ou 'étnica' parece inapropriado ao falarmos da nossa relação com a diversidade sexual ou étnica que compõe a nossa sociedade. Essa idéia, contudo, não é nova. Já na França da Revolução que mudou o mundo, alguns pensavam, ao falar de 'religião', que tolerar era uma atitude condescendente, restritiva e, por vezes, tirânica. Alguns filósofos da época preferiam antes termos como 'simpatia' ou 'respeito'.

Aqui cabe, no entanto, diferenciar opinião de conduta. Quando se diz que "fulano é sexualmente muito tolerante" - ou politicamente, ou culturalmente ou ... - está-se muitas vezes confundindo condutas - que, certamente, envolvem opiniões - das opiniões em si. As condutas, parece-me, são regidas mais por 'direitos/deveres' do que por 'tolerâncias'. Efetivamente, o outro, sendo outro, tem, no entanto, os direitos e os deveres que eu tenho. Não se tolera o pobre, nem o negro, nem o homossexual, nem... mas convive-se com, respeitando os seus direitos de partilhar, conosco, o mesmo espaço e construir, conosco, aquilo a que chamamos sociedade.

Mas, toleramos a opinião do outro que é contrária à nossa. Mesmo, ou melhor, principalmente, se a considerarmos falsa ou incoerente. O outro tem direito a pensar o que quiser, desde que respeite o meu direito de sustentar uma opinião oposta. O que vai intermediar esses extremos? A palavra. O objetivo da tolerância é que os seres humanos, no convívio entre si, possar crer e dizer o que lhes pareça ser verdade e que possam expressar isso, de modo a não pagar qualquer ônus de violência ou desrespeito. Isso entendo como PAZ.

Há, de fato, domínios em que a verdade é facilmente alcançável: regras gramáticais, leis morais, teoremas matemáticos etc. Não há muito o que tolerar efetivamente. Se alguém diz "a terceira pessoa do singular do presente do indicativo do verbo 'estar', de acordo com a norma padrão da língua portuguesa, é 'estera'", essa pessoa mente. Sua afirmação não pertence ao espaço do tolerar. Há, no entanto, domínios constitutivos do ser humano que são caracterizados pela incerteza. Alguns exemplos? Que modelo democrático é melhor? Que ética é melhor? Que religião é a mais correta? Onde está a felicidade? Nesta esfera de questionamentos, a reflexão permite-nos construir uma verdade - mas não A verdade - que deverá sempre dialogar com outras verdades construídas pelos outros, que têm igual direito de refletir e de, como nós, construírem as suas verdades.

Aqui parece-me ser o terreno fértil para a tolerância: a habilidade de dialogar sem violência, de coexistir com a opinião alheia, de iluminar-se por esse outro modo de pensar, sem perder a essência de quem somos - a nossa verdade.

E é a palavra que constrói as pontes da tolerância. A escola, lugar por excelência onde se aprende a usar a palavra deve preocupar-se em ser um lugar onde, mais que ensinar, se pratica a tolerância. Um lugar onde os alunos podem pensar o que quiserem - até o que nos pareça absurdo, como ser a favor do racismo ou da homofobia - desde que, junto, aprendam a defender suas idéias e - ainda mais importante - ouvir com critério e bom senso a idéia do outro, aceitando rever seus próprios conceitos quando a evidência assim o exige.

É por essa escola que escrevo estas linhas.

2 comentários:

  1. Oi Landeira, gostei muito de conhecer seu blog e poder ler tb o texto sobre "tolerância". Eu, que trabalho e portanto vivo a Filosfia Salesiana, compreendendo que Dom Bosco, em uma de suas reflexões deixou clara a compreensão da tolerância quando afirma que "Não basta amar, é necessário que a criança, o jovem, se sintam amados", e para isto concordo com vc, que é a escola mais um espaço para o diálogo, para a discussão e, tb o lugar de construir e reconstruir valores. Parabéns pelo blog, pelo texto e continue nos convidando a interagir, porque assim poderemos ir ampliando não só a nossa, mas ainda, ser um propagador de excelentes atitudes como esta sua - blogueiro da educação, em nossas práticas pedagógicas. E até em Recife dia 13/12/2008. Vc vai estar lá, não é? Abs, Zoraia

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  2. Oi Landeira, muito bom o seu texto. Sabe que não tenho muita paciência para elocubrações por escrito (prefiro falar), talvez pelo excesso de textos que li nos meus tempos acadêmicos ou hoje em dia, por força do trabalho, mas seu texto é fluido e vc tem uma grande qualidade: consegue escrever sem ser chato. Parabéns! É um orgulho estar aqui. Um abração.

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