Bakhtin(/Volochinov), em Marxismo e Filosofia da Linguagem, datado de 1929, define gênero como a unidade orgânica formada entre as formas de comunicação (ou seja, as relações entre os enunciadores em um determinado contexto), a forma de enunciação (o estilo, tomado como um termo muito geral, como a enunciação se procede) e o tema. Em 1953 realiza a sua mais famosa definição de gênero, desta vez entendidos como a unidade formada pelos temas ou conteúdos (ideologicamente conformados e possíveis de serem ditos por meio do gênero); uma forma composicional (elementos das estruturas comunicativas e semióticas presentes nos diferentes textos pertencentes ao gênero) e o estilo (ou marcas lingüísticas, traços da posição enunciativa do locutor).
Todo texto, visto como enunciado, deve serdeterminado, conforme Marxismo e Filosofia da Linguagem, pela situação social mais imediata. Valorizar a dimensão social é uma constante quando se fala de gênero na perspectiva bakhtiniana. Essas relações sociais são estruturadas e determinadas pelas formas de organização e distribuição dos diferentes papéis e lugares sociais nas instituições e situações em que se produzem os discursos. É o que se designa por esferas (ou campos) de comunicação. Essas esferas são divididas em dois grupos: as esferas do cotidiano e as dos sistemas ideológicos constituídos. Cada uma dessas esferas exige lugares sociais diferenciados, determinadas relações hierárquicas e interpessoais e a seleção de determinados temas, visando a certas finalidades e intenções comunicativas, a partir de apreciações valorativas sobre o tema e sobre a parceria.
Um determinado momento histórico surpreende um conjunto, mais ou menos cristalizado, de gêneros de discurso, vistos como mais adequados a esses lugares e relações, o que torna possível regularidades nas práticas sociais da linguagem. Os gêneros, assim postos para interagir também entre si e participando na construção da teia social, refletem o conjunto possível de temas e de relações nas formas e estilos de dizer e de enunciar. Como todos esses elementos, próprios do processo enunciativo, são irrepetíveis, cada enunciado se constrói como uma realidade sempre original.
Roxane Rojo, no texto "Gêneros do discurso e gêneros textuais: questões teóricas e aplicadas", defende que aqueles que adotam a perspectiva dos gêneros do discurso partirão sempre de uma análise em detalhe dos aspectos sócio-históricos da situação enunciativa, focando-se, antes de tudo, na vontade enunciativa do locutor, ou seja, a unidade formada pela finalidade da enunciação e a apreciação valorativa sobre seu(s) interlocutores e tema(s) discursivos. O que se pretende é uma descrição do texto/enunciado pertencente ao gênero ligada sobretudo às maneiras (inclusive lingüísticas) de configurar a significação. Ao chegarmos ao último nível, a análise lingüística pode revelar-se uma contribuição ímpar para a compreensão do discurso.
As regularidades de gênero encontradas devem-se não às formas fixas da língua, mas às regularidades e similaridades das relações sociais numa esfera de comunicação específica.
Referências bibliográficas
BAKHTIN, M. (1929). Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo: Hucitec, 1992.
__________ (1952-1953). "Os gêneros do discurso". In: ________. Estética da Criação Verbal. Trad. P. Bezerra. São Paulo: Martins Fontes, p. 261-306.
ROJO, Roxane. "Gêneros do discurso e gêneros textuais: questões teóricas e aplicadas". In: MEURER, J.L., BONINI, A. e MOTTA-ROTH, D. (org.). Gêneros: teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola, 2005.