Todos nós somos limitados
e feitos de fragmentos. Pedaços de quem somos fazem com que muitas vezes
sejamos, até, contraditórios. Falamos algo e somos até sinceros em nossa
exposição, mas pouco depois agimos de modo contrário àquilo que dissemos.
Espantamo-nos que no nosso coração sejamos capazes de sentir, ao mesmo tempo,
sentimentos contrários entre si.
Já o antigo poeta romano
Catulo (Verona, 87 ou 84 a.C. - 57 ou 54 a.C.) disse:
“Odi et amo,
quare id faciam fortasse requiris, nescio sed fieri sentio et excrucior”
(= Odeio e amo, como
isso é possível, você se pergunto. Não sei, apenas sei que assim o sinto e
sofro muito por causa disso)
Mas, em algum
momento, podemos viver uma experiência de transcendência. Ou seja, por algum
motivo, experimentamos uma sensação de totalidade. Sentimo-nos, de fato, um. E,
por vezes, não apenas um conosco mesmos, mas até um com os outros que vivem ao
nosso redor.
O espírito humano então
se eleva sobre as fronteiras que o tornam pequeno, menor do que gostaria de se
sentir e ele se sente total. É uma experiência do cotidiano. Trata-se de uma
elevação sobre os limites da vida que nem sempre é religiosa e, por natureza, é
sempre de curta duração. Nem mesmo para o místico dura por muito tempo. É
tarefa da religião preservar essa experiência, permitindo que ela ajude aquele que crê a se aproximar de
Deus.
É também tarefa das
Artes preservá-la. Possibilitando que o observador experiente se aproxime mais
perto de si mesmo e do outro, construindo-se em ponte. O poeta Mário de Sá
Carneiro (Lisboa, 1890 - Paris, 1916) escreveu:
“Eu não sou eu nem
sou o outro,
Sou qualquer coisa de intermédio:
Pilar da ponte de tédio
Que vai de mim para o Outro”.
Sou qualquer coisa de intermédio:
Pilar da ponte de tédio
Que vai de mim para o Outro”.
A arte,
sozinha, não pode assegurar que essa
ponte seja de amor ou de tédio. Isso cabe a cada um de nós escolher. Tais
escolhas nunca são fáceis e levam-nos a visitarmos cada espaço interior nosso
no trato cotidiano. Melhor optar por ser ponte de ternura e amor. Mas uma coisa
é certa: somos pontes de ‘mim para o Outro’.
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